segunda-feira, 8 de novembro de 2021

Um Conto - Ainda me lembro....

 
Vão me puxar pelos cabelos, eu pensava.
Tolhiam-me à fala porque, de medo, eu a engolia.
Beliscam minha pele, esquálida e branquela, eu me arrepiava todo.
Amedrontado, vêm os sustos, sucumbia-me em desespero.
Passava ao lado do Cemitério.
 
Sempre nessa hora,
quando o sol dá lugar à escuridão,
lembro que bem cedinho,
passava bem perto daquele beco,
onde viviam os mortos, que já viveram,
e eu, em vida, buscava o ganha pão,
e a labuta era em uma padaria,
no bairro Baixa da União.
O corvo grasnava, a coruja incrivelmente resplandecia,
a lua se escondia por entre as nuvens cúmulos nimbos sombrias,
e o silêncio ensurdecia, no céu, as estrelas desapareciam,
na terra, o pavor me enlouquecia
 
Na mente da criança, o medo apavorava,
a música na rádio tocava “era uma vez duas caveiras que se amavam...”
eu correndo como se corresse cheio de medo de alguém
que supunha a me perseguir, não era nada.
 
Tudo das lembranças de outrora,
visitava o sonho conturbado,
ainda me lembro desses momentos,
quando criança assustada,
eram quatro e meia da manhã, o silêncio perturbava,
ainda criança já lutava, na certeza que, minha família,
no que de comer todos os dias, ajudava.
 
Assim era a rotina, dia a dia e a caminhada era severa,
do bairro da Olaria, Passando pelo Centro, Mocambo e pelo cemitério,
chegava à padaria, onde um cesto de pão estava à espera,
pães para serem entregues nas bodegas dos bairros,
desde as cinco da manhã abertas, para vender à sua freguesia,
o pãozinho quente de todos os dias.
 
Depois do labor madrigal, de volta pra casa com os pães para a família desempregada, um banho, um café com pão e outra jornada, agora rumo à escola, era o Ginásio Dom Bosco, na Av. Almirante Barroso, tão longe quanto fora à primeira caminhada.
 
Já quase meio dia, de volta pra casa, um pouco de comida, uma pequena descansada,
Isopor nos ombros, lá saía pra outra labuta, vender picolé pelas ruas, escolas e praças, anunciava aos gritos as delícias geladas, feias com frutas da terra, da goiaba, perpassando pelo açaí, até de tapioca e de coalhada.
 
Ainda me lembro, desse tempo, dessa época, dessa jornada.
 
- Jose Valdir Pereira -




 

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