sábado, 29 de junho de 2024

RETALHOS DA HISTÓRIA DE RONDÔNIA - Maurílio Galvão da Silva - 14


Para que a história não seja esquecida ou mal contada.

Quando escrevo retratando a obra e a vida de um amigo, que, de repente, por decisão do Grande Arquiteto do Universo, nosso bom Deus, é levado para o céu, santo universo onde mora a legião dos Homens de bem, é porque sua passagem aqui na terra foi cheia de bons propósitos, pessoa que se dedicou ao bem, que atuou de forma incansável e responsável para melhorar as condições de vida de sua gente, de seus irmãos em Cristo, de todos àqueles que pudesse alcançar, através da palavra amiga, de atitudes solidárias, altruístas e cidadãs.

No caso em particular, ao referir-me ao cidadão deste texto que o homenageia, não com ouro, mirra ou prata, mas com as palavras que ficarão no registro da história dos pioneiros de Rondônia. Assim como já fiz com o médico Jacob Atallah, com o engenheiro José Airton Leite, com o economista Álvaro Lustosa Pires, com o poeta Gesson Álvares Magalhães e muitos outros, seletos e nobres guerreiros que, em vida, combateram o bom combate.

Desde o dia em que soube da passagem do irmão Maurilio Galvão, peço a Deus em minhas preces, com Sua benevolência, com Sua benignidade, com Seu poder de intervenção sobre a morte, que a vida dos meus prezados amigos dure por muitos anos, livrando-os de qualquer enfermidade, infortúnio ou desdita inevitável, deixando-os aqui no nosso meio por mais um tempo, dignos que são da piedade e das bênçãos de Deus.

Por que tão cedo e fugaz levar nosso amado irmão Maurílio Galvão? Certamente, viu Deus que já era chegada a sua hora. Que sua missão já havia sido cumprida aqui na terra. E que, como um anjo guardião do bem e do altruísmo na terra que se tornara enquanto aqui esteve, poderia, no céu, ter um alcance maior, mais amplo no cuidar dos seus semelhantes, e, também, no cuidar de outras criaturas de Deus.

Maurílio Galvão, conquanto não esteja mais aqui conosco fisicamente, não nos suscita tantos motivos para tristeza e lamentações. É que, para onde você levar seus pensamentos, com a presença dele, vêm uma miríade de lembranças boas, hilárias, cheias de alegria e de contentamento. Maurílio brincava até quando estava levando a sério uma conversa. Não era de reclamar naquele tom convencional, sempre maestro nas admoestações e mestre nos conselhos e ensinamentos.

Convivi com o Maurílio desde quando ele trabalhava na Secretaria de Planejamento e eu na Secretaria da Educação, em Rondônia. Dois técnicos, aliados a tantos outros (como Sílvio Persivo, Aldenor Neves, Pedro Albino), ligados pelo mesmo propósito: trabalhar em prol do desenvolvimento do Território Federal de Rondônia. E tudo culminou na elevação de Rondônia à categoria de Estado, a nova estrela brilhando no céu azul da União.

Mas é bom destacar o valor preciosíssimo do economista e professor Maurílio Galvão nesses momentos de amor e dedicação às missões que recebia, dada sua competência, responsabilidade e excelência em tudo que fazia: como técnico, como professor e como gestor. Maurílio foi de grande valia quando da organização dos distritos de alguns municípios de Rondônia para serem elevados à condição de Município, consecução de sua maturidade política. Neste particular, recebeu a incumbência de elaborar o orçamento desses municípios recém-criados, indo muito mais além, deixando-os devidamente organizados em termos de organograma, estrutura administrativa, normas e procedimentos.

Ainda se tornou prefeito nomeado do Município de Ariquemes, sucedendo o professor Pedro Tavares Batalha, onde desencadeou um brilhante trabalho de organização da gestão municipal, estruturação fundiária, fomento do comércio, apoio institucional às agremiações sociais, implementação de escolas, postos de saúde, criação de bairros, entre outras ações com vistas à consolidação do município que perpassava pelos seus primeiros passos de existência.

Foi, enquanto técnico, um aguerrido servidor, um profissional competente, dedicado e, por isso, era sempre requisitado pelos governadores para missões hercúleas e nobres.

Mas Maurílio era um cidadão incansável. Queria fazer mais. Ser apenas um técnico do governo, não lhe tomava muito do que podia oferecer. Por isso, ofereceu-se para ser professor da primeira instituição de educação superior de Rondônia, o CESUR, Centro de Ensino Superior de Rondônia, da qual eu era o Diretor, mantida pela FUNDACENTRO, fundação da Prefeitura do Município de Porto Velho, criada em 1985 pelo prefeito Antônio Carlos Cabral Carpintero, pela Lei municipal n.º 108, inicialmente denominada Fundação Universitária do Município de Porto Velho.

Durante a seleção dos professores para atuarem no CESUR, Maurílio Galvão submeteu seu currículo à apreciação da comissão, tendo sido aprovado para lecionar a disciplina Economia Brasileira, entre outras. Foi nessa época que outros técnicos, dos bons, os melhores, entre eles, Silvio Persivo, Pedro Albino de Aguiar, Aldenor Neves, foram selecionados para fazer parte do primeiro grupo magisterial do CESUR, que estava oferecendo à sociedade rondoniense três cursos de nível superior, Bacharelado em Administração, Ciências Econômicas e Ciências Contábeis.

Maurílio não se dedicava só ao magistério. Não era daqueles professores que vão à escola, ministram suas aulas e, feito isso, vão embora. Maurílio ficava na instituição e se oferecia para outros trabalhos, até extra-classe, que por ventura existisse. Por isso, eu como Diretor do CESUR, sempre nomeava Maurílio para presidir algumas comissões criadas, através das quais o CESUR ganhava organização, estrutura e funcionamento compatível com a demanda de seus alunos, nível de formação e expectativa de mercado de trabalho, com excelência e louvor.

Foi, ao lado dos economistas Silvio Persivo Cunha e Aldenor José Neves, juntamente com o bacharel em administração Pedro Albino, José Marcelo Farias, Lucindo José Quintãs, Rosália Maria Passos da Silva, Rogério de Freitas Bastani, entre outros, os professores responsáveis pelos trabalhos que desenvolvemos no sentido de ter o CESUR como a entidade embrião da Universidade Federal de Rondônia- UNIR. Nesta época, era Presidente da FUNDACENTRO, a entidade mantenedora do CESUR, o engenheiro Agrônomo Euro Tourinho Filho, que se tornaria, mais tarde, indicado pelo Governador Jorge Teixeira de Oliveira, o primeiro Reitor da Universidade Federal de Rondônia, nomeado, em 30 de setembro de 1982, pelo Presidente da República, João Figueiredo, empossado em 15 de outubro do mesmo ano. Euro, enquanto presidente da Fundação, nunca deixou de estar presente nas ações do CESUR, apoiando à mantida em todas as vertentes: financeiras, políticas, administrativas, educacionais e operacionais.

Maurílio Galvão, por sua vez, era um cidadão que não se negava ao trabalho. Quando não havia uma missão a cumprir, ele sugeria. Como a recém-criada Universidade Federal de Rondônia surgiu a partir da estrutura do CESUR, encampando todo o corpo técnico-administrativo, docente e discente da instituição, lá estava o professor e economista Maurílio Galvão, mais uma vez à frente de uma batalha honorífica e destinadas aos homens de valor, que amavam trabalhar por sua terra, Rondônia, dedicando ao bem-estar de sua gente. Fez parte do departamento de Economia da Universidade e, mesmo com tempo suficiente para desfrutar de uma aposentadoria merecida, com louvor, Maurílio preferiu continuar emprestando seus auríferos serviços à Universidade, aos estudantes da Universidade, porque amava ser professor de Economia, amava seus estudantes, e não menos, amava a instituição que ajudou a criar.

Outra particularidade do professor Maurílio era a de que ele gostava de participar de todos os eventos com os quais tivesse afinidade. Solenidades Cívicas, lançamento de livros, movimentos sindicais, estudantis e docentes, religiosos, maçônicos, políticos, educacionais. Um cidadão incansável. Era um ser que prestigiava a tudo que fosse voltado pata o bem e a todos. Um exemplar cidadão. Um nobre Cristão. Um grande amigo!

Aliás, convém que eu faça aqui este registro. Todos os anos Maurílio me convidava para participar do encerramento do semestre nos cursos que ministrava suas aulas de economia. E tinha orgulho em anunciar minha presença, dizendo aos universitários que ali estava um dos responsáveis pela criação da Universidade Federal de Rondônia, o primeiro Pró-Reitor da Instituição, ex-Diretor do Centro de Ensino Superior de Rondônia – CESUR.

Algumas vezes, pedia-me que levasse meu violão para fazer uma despedida do encerramento do semestre com música, onde eu cantava e tocava, e alguns universitários também. Ao final, distribuíamos livros. Alguns escritos por mim, outros que o professor Maurílio comprava para distribuir como brinde aos seus alunos. Era um professor muito querido por seus alunos.

Esse notável e adorado cidadão, jamais deixou de manter contato comigo, mesmo eu morando em Fortaleza. Como todos os anos fico alguns meses em Porto velho, Maurílio sempre queria saber quando eu chegaria e se tinha alguma programação cultural na minha agenda para ele participar. Como escritor, sempre tenho em minha agenda para Rondônia, os lançamentos de livros. E sempre contava com a participação do professor Maurilio, que não se importava em me ajudar nas atividades administrativas, àquelas relacionadas a transportar os livros, segurar o microfone, acompanhar-me na composição das mesas dos eventos. Os últimos eventos que estivemos juntos para lançamento de livro de minha autoria, ocorreram nos municípios de Guajará Mirim e Buritis. Fomos de carro. Viatura da prefeitura veio nos buscar. Não tinha tempo ruim para esse guerreiro.

Sempre alegre e festivo, fazendo amizade com todo o mundo, de todas as origens e credos e nacionalidades, ali estava o professor Maurílio. E eu adorava sua companhia. E ele jamais se esqueceu da relação que criamos, a de chefe, seu diretor, seu pro - reitor, já que, raramente não se referia a mim como tal. De Porto Velho à Guajará Mirim, de carro, nem bem saímos de uma cidade, já estávamos na outra, de tão agradável à viagem com as conversas do Professor Maurílio Galvão durante o percurso. Nossa! Como era bom ter sua companhia.

Maurílio era Maçom. Tenho irmão e amigos maçons, mas iguais ao Maurílio é desaconselhável dizer que existem, com a devida vênia dos nossos amados amigos maçons. Maurílio era a cara da Maçonaria. O corpo, a alma. Dedicado, respirava e vivia 24 horas a Maçonaria. E então, você me pergunta onde ele conseguia tempo para fazer tanto? Não sei responder. Apenas sei que, sempre estava ele a me convidar para esse ou aquele evento da Maçonaria. Quer quisesse ou não, jamais faltei ao convite do amigo Maurílio. Porque nas missões que eu recebia dos governadores e governos aos quais eu servia, ele sempre esteve ao meu lado e do meu lado a vida toda, desde que nos conhecemos nas frentes de trabalho. No princípio, ele responsável pelo orçamento do governo de Rondônia na Secretaria de Planejamento, e eu subsecretario da Educação de Rondônia.

Maurílio gostava dos amigos e sempre queria que os amigos participassem de suas alegrias dos seus momentos de lazer, quando, após longas horas de trabalho, ele procurava um pouco de descanso, de sossego, de paz, ao lado dos amigos, fazendo-nos rir, rindo, e lavando a vida como ele gostava de levar.

Maurílio era universal, eclético, ecumênico, múltiplo. Um ser fenomenal, impar, excepcional. Se você pensa que Maurílio era só isso, ledo engano. Era excelente articulista e seus artigos eram publicados na mídia impressa de Rondônia, com ênfase no Jornal do seu grande amigo Euro Tourinho (em memória) Jornal Alto Madeira. Uma das publicações que eu destaco, das tantas que guardo no meu arquivo, já que ele me enviava todas, é a publicada em fevereiro de 1994, intitulada "Absolutismo versus gestão pública", quando ele encerra o texto citando Leonardo da Vinci "Que o teu trabalho seja perfeito para que, mesmo depois de tua morte, ele permaneça." Parece que ele fazia seus trabalhos à luz desta citação.

Nesta época, em 1994, Maurílio Galvão já carregava em seus ombros muitas responsabilidades. Era Presidente do Conselho Regional de Economia, 24ª-Região-RO, membro do Conselho Fiscal do SINDSEF, membro do Núcleo de Ciências Sociais da Fundação Universidade Federal de Rondônia e Presidente em exercício do Sindicato dos Economistas no Estado de Rondônia, além de professor da Universidade Federal de Rondônia.

Meu desejo era tê-lo participando do meu livro, 2ª edição, “Rondônia: de pedaço em pedaço, uma história!”, revisão em curso e publicação programada para 2024. Ele já havia sido incumbido por mim, a pedido, para fazer a apresentação dessa 2ª edição. Quem melhor que o professor Maurílio para essa missão? Ninguém. Maurílio não nasceu em Rondônia, mas era um fervoroso rondoniense. Como técnico e como professor, conheceu as entranhas do Território Federal de Rondônia, conhecia a alma, o cérebro e o coração do Estado de Rondônia; era uma das maiores autoridades nesse diapasão, e nos aspectos políticos, geográficos, históricos e sociais. E, por quê? Era um estudioso, pesquisador, mexedor da terra, conversador sobre qualquer assunto, com quem quer que fosse, do mais humilde cidadão rondoniense ao mais letrado, apaixonado pela terra, pelo chão que seu corpo acolheu com respeito, onde aprendeu a ser feliz, amar e a ser amado, admirar e a ser admirado.

Conheci sua família, dada a convivência de amizade que tinha com o professor Maurílio, desde cedo, ainda no limiar dos trabalhos que desenvolvíamos para o governo de Rondônia. Com certeza, sua esposa e filhos guardarão na lembrança a grandeza do esposo e do pai que foi o Maurílio, dando a todos aquilo de que sempre precisaram para viverem da melhor forma possível, sem lhes negar educação, amor, atenção e o carinho paterno. Era um avô que fazia questão de mostrar o netinho, sempre em seus braços, como se fosse o maior presente que sua filha lhe dera.

Participei de alguns momentos vividos pela família e sempre me sentia regozijado com a felicidade que via haver no coração do Professor Maurílio quando desfrutava da companhia de sua esposa, de seus filhos e de seu neto.

Foi muito difícil aceitar a partida inexplicável de um amigo, com quem compartilhávamos momentos aprazíveis, de trabalho e de lazer, ao longo de muitos anos de nossa vida. Essa convivência divina, abençoada e saudável, todos com vistas ao bem-comum, com o fito de servir aos outros, à Pátria, à família e ao torrão onde vivemos, é uma consagração à fé cristã, à crença de que, se tudo somos e podemos, tudo vem da graça e da benignidade de Deus. Por isso, devemos retribuir.

Sua filha escreveu:

Ele gostava de lembrar que na data de hoje, ele havia chegado por estas bandas do norte. Viveu por 48 anos em Rondônia. Primeiro economista contratado do estado, trabalhou em Planos de desenvolvimento econômico, auxiliou na execução de vários orçamentos de varias prefeituras no interior. Foi prefeito de Ariquemes. Contemporâneo de Jorge Teixeira. Foram mais de 40 anos também dedicados à docência na Universidade Federal de Rondônia. Não acumulou riquezas materiais, mas amizades e memórias de muito valor. Pai, honro sua história, seus valores de honestidade no serviço público, seu amor pelas terras de Rondon.

Maurílio Galvão da Silva

Que lembremos, por muito tempo, o professor Maurílio como aquele amigo alegre, brincalhão, trabalhador, responsável.

Estive em 2020 em Porto Velho, a exemplo dos anos anteriores, tivemos uma agenda cultural e educacional cheia. Voltei para Fortaleza e em maio, exatamente no dia 2 de maio de 2021, soube da notícia do passamento do estimado amigo.

Lembremos o professor Maurílio Galvão com alegria. Vê-lo, na imaginação, de repente chegar e, com uma caneca e uma garrafa nas mãos, nos oferecer um brinde à vida, à amizade e ao porvir.












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